As Tentações de Todo Investidor Iniciante
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Este artigo direciona-se tanto a investidores iniciantes quanto àqueles com mais experiência que podem cair em uma armadilha comum: acreditar que uma ação no seu ‘fundo histórico’ é uma pechincha garantida. Analisar o gráfico e ver um preço muito baixo pode ser tentador, levando à crença de que a ação não tem mais para onde cair. No entanto, essa ideia é equivocada e representa um dos principais erros de quem começa a investir. Uma ação barata, mesmo no seu menor preço histórico, ainda pode desvalorizar e resultar em uma série de grupamentos de ações. O ‘fundo histórico’ não garante lucro futuro.
A Fórmula da Riqueza
O investidor iniciante, empolgado com as oscilações do mercado, frequentemente se deslumbra com as histórias de empresas que valorizaram muito no passado. Ele começa, então, a fazer cálculos imaginários de quanto teria ganho se tivesse investido nessas empresas anos atrás. Nesse momento de reflexão, surge a tentação do “turnaround“: empresas em dificuldades que, segundo alguns analistas, têm potencial para uma recuperação espetacular. Essa narrativa sedutora pode, portanto, levar o investidor iniciante a acreditar que encontrou a fórmula mágica para enriquecer.
Acreditando ter encontrado uma grande oportunidade, o investidor iniciante analisa o gráfico da empresa. Ele observa que a ação, que antes era negociada a R$ 10,00, agora atingiu seu “fundo histórico” de R$ 5,00. Lembrando que a ação já esteve nesse patamar há um ano e se recuperou, ele decide investir, acreditando que a história se repetirá. Afinal, se a empresa se recuperou uma vez, por que não se recuperaria novamente? Esse pensamento, aparentemente lógico, esconde um grande risco.

O Dilema do Investidor
A situação se agrava rapidamente. A ação, comprada por R$ 5,00, cai para R$ 2,50 em poucas semanas. A atenção da mídia diminui, e o investidor iniciante se vê diante de um dilema: esperar pacientemente pela recuperação na esperança de que o preço volte a subir, ou comprar mais ações para reduzir o preço médio, buscando minimizar as perdas ou até mesmo obter um pequeno lucro caso a ação se recupere um pouco. Ambas as opções apresentam visões muito perigosas.
As semanas se passam, e o pesadelo do investidor iniciante se concretiza. A ação, adquirida com a esperança de valorização, derrete para menos de R$ 1,00. O interesse da mídia desaparece completamente, afinal, a empresa e suas ações já não são mais o assunto do momento. É nesse cenário desolador que surge o anúncio do famigerado grupamento de ações, uma medida desesperada que muitas vezes sinaliza problemas ainda maiores. A empresa, na tentativa de evitar a saída da bolsa de valores e dar a impressão de recuperação, realiza o grupamento, o que pode ser um golpe devastador para o pequeno investidor.
O que é Grupamento de Ações?
O grupamento de ações, também conhecido como inplit ou split reverso, é o processo pelo qual uma empresa reduz a quantidade de ações em circulação no mercado, aumentando proporcionalmente o valor de cada ação. Para ilustrar, imagine que você tem várias moedas pequenas e as troca por notas de valor equivalente. Assim, a quantidade de “papéis” diminui, mas o valor total continua o mesmo. É exatamente isso que acontece no grupamento de ações.
Como funciona:
A empresa define uma proporção para o grupamento, por exemplo, 2 para 1, 3 para 1, 10 para 1, etc. Essa proporção indica quantas ações antigas serão agrupadas para formar uma nova ação.
- Exemplo 10 para 1: A cada dez ações que o acionista possuir, ele receberá uma nova ação com dez vezes o valor. Ou seja, antes o investidor tinha 10 ações no valor de R$ 1,00 cada e agora ele apenas 1 ação no valor de R$ 10,00.
Objetivos do Grupamento:
- Aumentar o preço da ação: Empresas com ações de baixo valor podem realizar o grupamento para elevar o preço das ações, tornando-as mais atrativas para alguns investidores institucionais ou para atender a requisitos mínimos de listagem em bolsas de valores.
- Reduzir a volatilidade: Em alguns casos, o grupamento pode ajudar a reduzir a volatilidade das ações, tornando o preço menos suscetível a pequenas oscilações.
- Melhorar a Imagem da Empresa: Quando o preço de uma ação é muito baixo, isso pode, em alguns casos, gerar uma percepção negativa sobre a empresa. O grupamento de ações pode ajudar a melhorar essa imagem.
- Consolidação de Ações: O grupamento pode ser utilizado para remover do mercado ações com valores muito baixos, o que facilita a negociação e reduz os custos administrativos.
Diferença entre Desdobramento e Grupamento de Ações:
É importante não confundir grupamento com desdobramento (split). O desdobramento é o oposto do grupamento: a empresa aumenta a quantidade de ações em circulação, reduzindo proporcionalmente o preço de cada ação.
Impactos do Grupamento
- Valor da empresa: O valor total da empresa, em teoria, não se altera com o grupamento. Apenas a quantidade de ações e o preço por ação são modificados.
- Posição do acionista: A participação percentual do acionista na empresa permanece a mesma após o grupamento.
- Liquidez: A liquidez das ações pode ser afetada pelo grupamento, tanto positiva quanto negativamente, dependendo das circunstâncias.
A Realidade Bate a Porta: Pós Grupamento de Ações
Agora, com o grupamento, a ação, que valia menos de R$ 1,00, é cotada a R$ 10,00 após o grupamento 10:1. Mas essa alteração no preço é apenas uma ilusão. O investidor iniciante, agora com menos ações, descobre, da maneira mais difícil, que um ativo pode cair repetidas vezes, mesmo após um grupamento. Não seria surpresa se, em alguns meses, a empresa estivesse novamente negociada abaixo de R$ 1,00, forçando um novo grupamento e reiniciando o ciclo vicioso de desvalorização. O grupamento, em muitos casos, apenas mascara a realidade dos problemas da empresa, adiando o inevitável.
* Atualmente, as regras da B3 proíbem empresas a negociarem ações com preço abaixo de R$ 1 durante mais de 30 pregões consecutivos.
Observamos essas situações algumas vezes, e a PDG exemplifica este cenário, conforme a tabela de grupamentos abaixo.
Data de grupamento | Proporção |
---|---|
21.10.2024 | Grupamento de 10 ações para 1 ação |
06.03.2023 | Grupamento de 100 ações para 1 ação |
14.01.2019 | Grupamento de 10 ações para 1 ação |
09.10.2015 | Grupamento de 50 ações para 1 ação |
Gráfico de PDGR3

Neste momento, o leitor pode se questionar se esses casos de grupamentos de ações são apenas exceções, eventos raros que acontecem somente com empresas problemáticas ou em situações extraordinárias. Embora o grupamento em si não represente necessariamente um problema, ele frequentemente acompanha empresas com dificuldades financeiras ou em processos de reestruturação, sendo um sinal de alerta para o investidor.
Realidade atual
Conforme analistas, o aumento de grupamentos de ações tem ocorrido com maior frequência nos últimos anos devido maiores dificuldades financeiras das empresas impactadas pela taxa de juros, inflação, descontrole fiscal e a situação política do Brasil.
Ano | Eventos de grupamentos |
---|---|
2018 | 5 |
2019 | 7 |
2020 | 5 |
2021 | 4 |
2022 | 4 |
2023 | 17 |
Analisar Fundamentos é Essencial
Neste artigo, acompanhamos a jornada de um investidor iniciante que, seduzido pela aparente pechincha de uma ação em seu “fundo histórico”, acabou caindo na armadilha do grupamento de ações. Observamos como a ilusão de ganhos passados, juntamente com a esperança de um “turnaround” e a falsa segurança do “já aconteceu antes”, podem levar a decisões precipitadas e, consequentemente, a perdas significativas. Essa história, embora fictícia, reflete, no entanto, uma realidade comum no mercado de ações.
A lição fundamental aqui é que a análise dos fundamentos de uma empresa — sua saúde financeira, seu modelo de negócios e suas perspectivas de futuro — deve ser prioritária para qualquer investidor, seja ele iniciante ou experiente. Concentrar-se apenas no preço, especialmente em preços que parecem baixos demais, pode, assim, levar a armadilhas como o grupamento de ações e à consequente perda de patrimônio. Portanto, investir com base em fundamentos sólidos é o caminho mais seguro para alcançar sua independência financeira a longo prazo.